O remador italiano Giacomo Perini, que disputou a prova do skiff simples PR1 nos Jogos Paralímpicos de Paris 2024, teve pouco tempo para comemorar sua conquista da medalha de bronze. E o motivo foi inusitado: o paratleta foi desclassificado por esquecer o celular no barco em que competiu.
Conforme as regras da competição, não é permitido o uso de nenhum tipo de aparelho de comunicação durante a prova. O paratleta, de 28 anos, alegou que o celular não foi usado durante a competição, mostrando até mesmo o telefone ao júri, indicando as últimas ligações e mensagens feitas no dia anterior à prova.
De acordo a Federação Internacional de Remo, o paratleta violou o artigo 28, parágrafo 5, alínea “a”, do Apêndice R2 de seu Estatuto, que proíbe qualquer tipo de comunicação eletroeletrônica durante as provas. De acordo com Matheus Laupman, advogado do Ambiel Advogados e especialista em Direito Desportivo, a situação é delicada e requer análise minuciosa das regras estatutárias da Federação.
“O artigo em questão é claro ao proibir o uso de equipamentos eletroeletrônicos para comunicação durante a prova e/ou troca de dados com terceiros. Acontece que o paratleta alega não haver utilizado o aparelho, seja direta, seja indiretamente. Parece ser com base nisso que ele, se pretender contestar a punição contra si imposta, baseará toda a sua defesa perante as autoridades competentes”, explica.
Nesse sentido, poderá o paratleta italiano, visando à reforma ou anulação da decisão do órgão julgador da Federação Internacional de Remo, que lhe sacou a medalha de bronze, interpor um recurso à Corte Arbitral do Esporte (TAS/CAS), sediada em Lausanne, na Suíça. “O artigo 65 do Estatuto prevê que, nesse tipo de casos, as alegações deverão basear-se em princípios fundamentais de direito ou nas próprias disposições estatutárias”, destaca o advogado. “A decisão proferida pela Corte será definitiva no âmbito esportivo e, se lhe for favorável, poderá restituir a medalha ao italiano”.
Quanto à possibilidade de reversão da decisão perante o TAS/CAS, Felipe Crisafulli, sócio do escritório Ambiel Advogados e especializado na área de Esportes e Entretenimento, explica ser sempre muito difícil fazer esse tipo de prognóstico. “O remador italiano terá violado, pelo que se viu, disposição de natureza objetiva, em que se prescinde, a princípio, de qualquer elemento volitivo. Ou seja, discussões de natureza subjetiva, relativas a dolo ou culpa, parecem não ter muito lugar aqui”.
Ainda assim, não seria estranho o paratleta trazer essas discussões em eventual recurso. “As normas antidopagem são, em geral, igualmente de caráter objetivo, mas nem por isso aspectos subjetivos deixam necessariamente de ser levados em conta no caso concreto. Demonstrar que não teve a intenção de violar a disposição do Estatuto, que jamais fez uso do celular enquanto disputava a prova, que se tratou de mero esquecimento do aparelho dentro do barco, incapaz de influenciar o seu próprio resultado ou a competição como um todo, enfim, são diversos dos argumentos que a defesa do atleta provavelmente lançará mão perante o TAS/CAS, se o recurso vier a ser de fato interposto. Agora, se isso será suficiente a convencer o Tribunal e devolver o italiano a seu lugar no pódio, só o tempo poderá trazer essa resposta”, arremata o advogado.
O desfecho deste caso poderá estabelecer um importante precedente no esporte paralímpico e reforçar a importância do cumprimento estrito das regras, ao mesmo tempo em que garante a possibilidade de contestação justa em situações excepcionais.