Buquê de flores para presentear, uma plantinha para embelezar a casa. Um segmento que lida diretamente com as emoções das pessoas e tem nas mulheres seu maior consumidor final também assiste ao crescimento da presença feminina em todos os elos da cadeia – e isso é, principalmente, uma estratégia de negócios.
Segundo levantamento que o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) e o Instituto Brasileiro de Floricultura (Ibraflor) elaboraram em parceria, em 2022, o mercado de trabalho de flores e plantas ornamentais tinha 48% de participação feminina, uma fatia superior à média nacional, de 43%, que considera todos os ramos de atividade. O contraste é ainda maior quando se faz a comparação com o universo da agropecuária, em que as mulheres ocupavam somente 19,6% das vagas de trabalho naquele ano.
Neta de pecuarista, Raíssa Teresani Scian personifica a força feminina nesse setor: ela cultiva plantas ornamentais junto com o marido em Holambra (SP), a cidade das flores, desde que, há oito anos, o casal decidiu apostar na produção e criou a Swalmen Plantas.
“Meu marido já trabalhava com flores e plantas na área comercial, ele era atacadista, mas o negócio dele nunca foi escritório. Eu sou formada em propaganda e marketing e sempre trabalhei no agro, inclusive na área de eventos, até que decidimos montar a empresa”, conta.
Quando a Swalmen Plantas nasceu, Raíssa e o marido eram as únicas pessoas na operação. Três meses depois, ela descobriu que estava grávida. A empreendedora continuou na produção durante a gestação. “Começamos com três pessoas e hoje estamos em 12, porque boa parte da produção é automatizada”, diz.
Ao longo do tempo, a companhia também percebeu que havia um diferencial entre o trabalho feminino e o masculino na lida com as suculentas, plantas que são a especialidade da Swalmen.
“Naturalmente percebemos que o manuseio feito pelas mulheres era melhor. Por ser uma planta muito pequena, a suculenta precisa de uma delicadeza que as mulheres têm mais. Hoje, elas compõem 90% da nossa equipe”, afirma.
Associada à cooperativa Veiling Holambra, a Swalmen Plantas trabalha com 148 variedades de suculentas e lança, em média, outras dez espécies por ano. O carro-chefe, conhecido como p11, é vendido em autosserviços, floriculturas e a colecionadores. Segundo Raíssa, em 2023 foram comercializados 1 milhão de vasos de suculentas p11. Mas o ano de maior faturamento foi 2020, quando a pandemia de Covid-19 manteve as pessoas dentro de suas casas e o cuidado com flores e plantas tornou-se algo até com objetivos terapêuticos. Em consequência, a demanda aumentou.
“As pessoas viram benefícios e criaram esse hábito de ter plantas em casa. Hoje, o volume pode não ser o mesmo daquele ano, mas o conceito se perpetuou e segue crescente”, avalia. “Acredito que esse setor vai voltar a ter uma expansão em flores, por exemplo, com a valorização dos eventos mais uma vez ganhando força”, acrescenta.
Raíssa conta que, quando atuava no segmento de eventos voltados ao agronegócio, como profissional de marketing, percebia um preconceito muito maior pelo fato de ser mulher. “Eu fingia que não via e seguia em frente. No setor de flores e plantas, não sinto nenhum preconceito. As mulheres se fazem muito presentes”, comenta.
Além de suas atividades na Swalmen Plantas, a agricultora também se dedica a um comitê de mulheres da Veiling Holambra. Ela diz que, nesse trabalho, tem percebido que o público feminino temparticipado cada vez mais do ramo de flores e plantas ornamentais, e cada vez mais cedo, seja via sucessão familiar ou como iniciativas para oferecer inovações tecnológicas para a cadeia produtiva.
Dentro da Veiling Holambra, a gerente de marketing e produtos Thamara D’Angieri é uma das mulheres que atestam a força da mão de obra feminina nesse mercado. A executiva está na cooperativa desde 2006, onde começou como assistente de marketing. Nesse período, ela assistiu ao forte crescimento da Veiling, cujo faturamento dobrou nos últimos 15 anos, passando de R$ 500 milhões para a casa do R$ 1 bilhão – e com a ajuda de estratégias que a profissional ajudou a desenhar.
“Éramos uma empresa pequena em Holambra. A gente foi evoluindo tanto da porteira para dentro, com o produtor mostrando a importância da inovação, tecnologia e sustentabilidade, quanto da cooperativa para fora, até o consumidor final”, diz. No início, afirma Thamara, o marketing não tinha nem orçamento dentro da cooperativa.
“Comecei a entender o que significavam as flores e plantas na vida das pessoas e falei que precisávamos entender o mercado de consumo para aumentar a capilaridade do nosso produto. E o marketing foi crescendo aos poucos”, lembra ela, que hoje lidera uma equipe de 20 pessoas.
A executiva conta que, em 2014, representantes da cooperativa foram aos Países Baixos em busca de ideias para inovar no mercado brasileiro. Depois disso, algumas práticas, como a abertura para que clientes de menor porte pudessem comprar da Veiling, foram uma grande virada de chave para a empresa. A cooperativa vende flores para outras empresas, como supermercados e garden centers, atuando no chamado B2B, mas a pequena floricultura também se tornou cliente da central.
“Passamos a adotar uma estratégia diferente em 2019, com parcerias com grandes influenciadoras, que mostraram a importância das flores, o bem-estar e a emoção que a flor leva para a vida das pessoas. Começou a dar muito resultado”, afirma.
Ela ressalta que o mercado comprador no segmento B2B é composto de muitos homens, mas que ser mulher certamente contribuiu no momento de encontrar as estratégias de negócio mais adequadas para a cooperativa. “A facilidade que a mulher tem de enxergar oportunidade de negócios é muito alta, somos muito resilientes. Na pandemia, conseguimos levar nossa estratégia a outro patamar, com a venda de flores nos supermercados”, comenta.
O ano de 2023 foi mais difícil para o segmento porque, passado o período de isolamento social, as pessoas voltaram a sair e passaram a repensar a importância de ter flores em casa. Ainda assim, a executiva diz que a Veiling continuou em ritmo acelerado. “Nosso faturamento cresceu 10% em comparação com 2022, e estamos prevendo um crescimento de 8% em 2024”, diz.
Além do retorno dos eventos, uma via de expansão para o segmento pode estar nos autosserviços, avalia a executiva. “Na Holanda, já tem flores em postos de gasolina, por exemplo. Podemos ver onde ainda há oportunidades para negócios aqui no Brasil”, afirma ela.
A cooperativa também faz planos de crescer em diferentes regiões do país, com base nas culturas locais e religiões. É o caso das festas de Iemanjá, que ocorrem em fevereiro e que demandam flores brancas, entregues pelos praticantes das religiões de matriz africana como oferenda. “O foco do marketing para 2024 é entender e levar ao consumidor aquilo que faz parte da cultura dele”, acrescenta.
Texto: Por Nayara Figueiredo — São Paulo