Abandonado desde 2009 em Ariquemes, a 200 quilômetros de Porto Velho, o Banco de Sementes e Essências Florestais de Rondônia não condiz com a boa imagem científica amazônica, e será transformado em Viveiro Educador.
O anúncio foi feito nessa terça-feira (19) pelo presidente da Fundação de Amparo ao Desenvolvimento das Ações Científicas e Tecnológicas e à Pesquisa do Estado de Rondônia (Fapero), Francisco Elder Souza de Oliveira.
A Fapero começou a elaborar, em parceria com a Secretaria Estadual do Desenvolvimento Ambiental (Sedam), o pré-projeto para recuperação do banco. A execução ficará a cargo da organização não-governamental Rio Terra.
Atualmente, para distribuir mudas de açaí e de abacaxi, o governo tem que buscá-las nos estados do Pará e do Acre. Cem mil pés de abacaxis da variedade pérola, plantados na Fazenda Futuro (do sistema prisional do estado) deverão se multiplicar dentro de dois anos, com a supervisão de técnicos da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Rondônia (Emater-RO). Ali existe um plantio de bananas livre de doenças, com mudas trazidas do distrito de União Bandeirantes (a 160 quilômetros da Capital).
Paralelamente à necessidade de ampliar conhecimentos florestais na rede escolar, a disponibilidade de mudas frutíferas entrou na pauta prioritária ambiental do estado.
“Ainda neste semestre, a educação estadual e o meio ambiente passarão a dispor do Viveiro Educador, que não apenas distribuirá mudas, mas fomentará o aprendizado da botânica nesta parte da Amazônia”, comentou Oliveira.
A Fapero e a Sedam se unirão à Secretaria Estadual de Educação (Seduc) e às universidades para transportar até o Viveiro Educador grupos de alunos e acadêmicos dispostos a estudar os diversos tipos de vegetais.
Esse viveiro significa a oportunidade de a população estadual, quase 40 anos depois do início do ciclo migratório que lhe dá hoje 1,7 milhão de habitantes, conhecer o seu passado e presente florestais. “Mesmo raras no cenário, árvores gigantes correm o risco de passar à história geoecológica de Rondônia sem que as novas gerações as apreciem”, alertou Oliveira.
Ele lembrou, por exemplo, a mafumeira (Ceiba Pentandra Gaertn), com mais de três metros de diâmetro, nativa do México, América Central e Caraíbas; e Norte da América do Sul, de tronco volumoso que cresce entre 60 a 70 metros de altura.
Sagrada para o antigo povo maia, cantada em sessões da religião espírita União do Vegetal, a samaúma falada por caboclos na Amazônia é uma das maiores árvores do mundo, também conhecida por “mãe das árvores”, “árvore da vida”, escada do céu, sapopemba, algodoeiro ou barriguda.
A palavra samaúma é usada para descrever a fibra obtida dos seus frutos. Em determinados períodos do ano, elas estrondam, irrigando a área em seu entorno e os vegetais que a circundam.
“Vejo que a antiga cobertura florestal de Ariquemes tinha muitas samaúmas, assim como a castanheira (Bertholletia excelsa) e o mogno (Swietenia macrophylla) eram abundantes no interior rondoniense e no noroeste mato-grossense, porém, preocupa-me o fato de as crianças rondonienses desconhecerem nossas espécies nativas, sabendo mais a respeito do plantio de pinheiros (Pinus elliotti), eucaliptos (Eucalyptus) e, possivelmente, de outras árvores comuns em estados do Sul e Sudeste”, opinou Oliveira.
RESGATE
Geladeiras desligadas, produção abaixo da média, viveiros carentes de recuperação e ausência de projetos chamaram a atenção do governo estadual.
O antigo banco de sementes inaugurado em 1997 sobrevive atualmente do mutirão de funcionários. Em 2009 houve tentativa para reerguê-lo, o que poderá ocorrer em 2016.
Segundo Oliveira, depois de visitar o centro de estudos da ONG Rio Terra, em Itapuã do Oeste (a 94 quilômetros de Porto Velho), o governador encarregou a Fapero e a Sedam de elaborar o pré-projeto.
O Viveiro Educador também servirá de base para a instalação da futura biofábrica com viveiros, laboratório e equipamentos, idealizada pelo governo do estado para fortalecer parcerias com pequenas, médias e grandes empresas.
“O laboratório será um multiplicador que vai acelerar a produção de sementes, mudas de abacaxi, banana, cacau, café, e de essências madeireiras de interesse do Projeto Floresta Plantada”, previu Oliveira.
O tripé do Viveiro Educador será: produção de mudas, pesquisa e educação ambiental.
MULATEIRO, COPAÍBA, ANDIROBA, BREUZINHO
Fapero, Sedam e Rio Terra, o trio responsável por essa transformação em Ariquemes, assumem, assim, o compromisso da conservação ambiental na região. Oliveira acredita, inclusive, que o êxito da experiência servirá de modelo para outras regiões do estado, notadamente o Sul e o Oeste, ambos ocupados pela atividade pecuária que já resultou em diversas áreas desmatadas.
No pré-projeto constam a identificação de áreas com sementes disponíveis, coleta, armazenamento e beneficiamento.
Segundo Oliveira, atualmente ainda é possível colher mudas, embora não se tenha com exatidão um estudo indicador da reprodução e do tempo de duração de espécies nativas sobreviventes dos períodos de atividades de empresas mineradoras e do assentamento de famílias pelo Incra, quando tratores, máquinas gigantes e mãos humanas destruíram espécies nativas do século passado, entre as quais o mulateiro, breuzinho, copaíba, andiroba e outras.
Da casca do mulateiro é feito um chá usado no combate a manchas na pele, rugas e envelhecimento facial. Conta a lenda que as guerreiras amazonas se banhavam, em noites de lua cheia, com um preparo da casca dessa árvore para se manterem sempre jovens e belas. Dessa forma, o mulateiro ficou conhecido entre as populações ribeirinhas como “árvore da juventude”.
Da copaíba (Copaifera ou cupayba) extrai-se óleo com diversas aplicações medicinais. Estima-se que a cada ano mais de 120 mil litros saiam de Rondônia para outros estados brasileiros. Ela é cicatrizante, antileucorreica e antitetânica. É também conhecida na Amazônia e em estados do Sul e Sudeste por bálsamo do Brasil, pau-d’óleo e copaibeira.
Nos arquivos da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro, consta que o padre José de Anchieta, ao celebrar a primeira missa no Brasil, utilizou a resina do breuzinho em seu ritual, denominando-a mirra brasileira.
Conhecida de indígenas e ribeirinhos, a resina aromática do poderoso breuzinho é rica em tritepenos alpha e beta-amyrina, ambas com propriedades analgésicas, anti-inflamatórias e gastro-protetoras, cientificamente comprovadas em pesquisas feitas pelo Departamento de Fisiologia e Farmacologia da Universidade Federal do Ceará (UFCE) e pelo Departamento de Química da Universidade Federal de Rondônia (Unir).
A resina do breu-branco é usada como anti-inflamatório, cicatrizante, analgésico, estimulante, em obstruções de vias respiratórias, asma, bronquite, tosse, dor de cabeça, dor de estômago, problemas de memória, e auxilia na coordenação motora e na calma para pessoas agitadas. Também é usada como incenso em igrejas e na calefação de barcos.
Para Oliveira, o estudo fisiológico das plantas rondonienses por crianças e jovens é imprescindível. “Eles precisam conhecer o quanto antes as espécies nativas, sua resistência, indicação para o tratamento de doenças e, ao mesmo tempo, garantir ar puro e a venda do carbono florestal”.
Fonte
Texto: Montezuma Cruz
Fotos: Arquivo Fapero
Secom – Governo de Rondônia